PARTE 12
1920
Contrato
Social da Fundação da empresa “Seguin & Rascon”.
“Lucas
Fernandes Gonsalves, Serventuário Vitalício do Primeiro Ofício de Tabelião de
Notas da cidade de Mocajuba, etc. Certifico que revendo o Livro Nº (21) vinte e
um, de escrituras deste cartório, a folha 88 v. (verso) a 90, consta o
seguinte:
Escritura
pública de sociedade comercial que fazem e assinam os Senhores Francisco Seguin
Dias, Samuel Prudêncio de Souza Júnior, Sérgio Rascon Martínez e Estevam Obal
da Silva, como abaixo se vê.
Saibam quantos
esta pública escritura de sociedade comercial virem que no ano do Nascimento de
Nosso Senhor Jesus Cristo, de Mil Novecentos e Dezessete (1917), aos cinco dias do mês de fevereiro nesta cidade de Mocajuba, Segundo Distrito Judicial da
Comarca de Cametá, a Rua Siqueira Mendes, em meu cartório, ali perante
mim Tabelião e as suas testemunhas abaixo nomeadas e no fim assinadas,
comparecerão presentes, partes justas e contratadas, o Senhor Francisco Seguin
Dias, casado, espanhol; Samuel Prudêncio de Souza Júnior, casado,
brasileiro; Sérgio Rascón Martinez,
solteiro, espanhol, e Estevam Obal da Silva, solteiro, alemão, residentes neste
município e no de Cametá neste Estado, que reconheço serem os próprios do que dou fé. E por todos me foi dito
perante as suas testemunhas infra-assinadas que por bem desta escritura e na
melhor forma de Direito se acham contratados, para constituírem entre si uma
sociedade comercial com as cláusulas reciprocamente aceitaram e abaixo seguem:
- Primeira
clausura. O fim social é compra e venda de mercadorias e gêneros nacionais e
estrangeiros.
- Segunda clausura.
A sociedade é um nome coletivo a respeito dos sócios presentes com a
responsabilidade diretamente ao sócio comanditário Francisco Seguin Dias, que
constitui as sociedades entre os sócios seus, como o capital de quatorze contos
de réis em dinheiro e mercadorias existentes para os fundos sociais.
- Terceira
clausura. As firmas sociais agirão sob a razão de: Seguin & Obal, em Icatú;
Seguin & Rascon, nesta cidade, e Seguin & Souza, no município de
Cametá.
- Quarta
clausura. É vedado ao sócio comanditário quaisquer atos de gerências nas casas
comerciais nem mesmo ainda como procurador, posto que o uso exclusivo das
firmas ora constituídas pertencem aos sócios. - Samuel Prudêncio de Souza
Júnior, Sérgio Rascon Martinez e Estevam Obal da Silva respectivamente em todos
os atos que se refiram aos negócios das sociedades.
- Quinta
clausura. A duração das sociedades é por tempo indeterminado, devendo,
entretanto, contar pela sua responsabilidade do dia primeiro do ano corrente,
tempo em que comemorarão as operações sociais.
- Sexta
clausura. As escriturações comerciais ficam a cargo dos sócios responsáveis de
cada um dos estabelecimentos sociais, que as conservarão sempre em dia, feitas
com asseio e de conformidade com a Lei comercial brasileira.
Sétima
clausura. No dia trinta e um do mês de dezembro de cada ano comercial,
procede-se aos balanços gerais nesse tempo, então o sócio comanditário será
convidado para um dia certo e determinado, tomar conhecimento dele e tomar as
providências que achar conveniente para o interesse seus e das próprias
sociedades, propondo a confirmação do mesmo negócio ou a sua dissolução.
Oitava
clausura. É expressivamente proibido a qualquer um dos sócios vender
mercadorias a prazo ou fiados por conta da sociedade, cabendo todas as responsabilidades
relativas, respectivamente.
Nona
clausura. O capital do sócio comanditário que constitui o fundo de reserva da
firma Seguin & Obal é de quatro contos de réis; Seguin & Rascon, seis
contos de réis, e, Seguin & Souza, quatro contos de réis em mercadorias e
dinheiros.
Décima
clausura. Os lucros líquidos verificados pelos balanços em partes iguais, ou
sejam, cinquenta por cento a cada um e os prejuízos por conta exclusivas (erro
gramatical na escritura), digo,
exclusivos dos sócios responsáveis pelo comércio.
Décima
primeira clausura. A quota dos lucros verificados pertencentes a cada um dos
sócios responsáveis depois de conferidos pelo sócio comanditário será levado a
Conta Corrente com retirada franca, relativamente, a este e aos demais levados
a conta de Capital Social.
Décima
segunda clausura. No caso de falecimento de algum dos sócios, durante o tempo
da sociedade, o sócio sobrevivente liquidará a sociedade em pleno acordo com os
herdeiros do sócio falecido, pagando de acordo com as forças do comércio o saldo
verificado, deduzindo deste qualquer prejuízo encontrado, depois do fechado o
respectivo balanço comercial (erro gramatical na escritura), digo, final.
E por se
acharem assim contratados, me pediram lhes fizesse esta escritura que
sendo-lhes lida e achada conforme, assinam com as testemunhas presentes, o
Capitão Theophilo Ottoni Ferreira Franco, Francisco Xavier Corrêa, pessoas
idôneas do meu conhecimento, residentes neste distrito, que também assinam.
Eu, Lucas
Fernandes Gonsalves, Tabelião que o escrevi subscrevo e também assino com o
selo próprio abaixo aderentes e institisados do que tudo dou fé.
Lucas
Fernandes Gonsalves.
Francisco
Seguin Dias.
Samuel
Prudêncio de Souza Júnior.
Sérgio
Rascon Martinez.
Estevam Obal
da Silva.
Theophilo
Ottoni Ferreira Franco.
Francisco
Xavier Corrêa.
Estavam
cinco estampilhas federais no valor de trinta mil réis devidamente instituídas.
Era o que se
continha em as oito folhas do mencionado livro as quais me reporto e de onde
bem e fielmente fez extrair a presente certidão que depois de haver conferido e
contratado, por acha-la em tudo conforme subscrevo e assino nesta cidade de
Mocajuba, aos vinte dias do mês de março de mil novecentos e vinte.
Eu, Lucas
Fernandes Gonsalves, Tabelião quem fiz transcrever esta, subscrevo e assino,
depois de conferir com o original e dou fé.
Mocajuba, 20
de março de 1920.
O Tabelião
Lucas
Fernandes Gonsalves.
B – 2$500
C – 2,000
R – 4,830
2,330
Reconheço
verdadeiras as assinaturas nesta de Lucas Fernandes Gonsalves, e dou fé.
Mocajuba, 20
de março de 1920
Em
testemunho A. (Arthur) P. (Pedro da) I. (Igreja) da verdade.
L. e L. 1$100
Apresentado
hoje pelo Sr. Sérgio Rascon Martinez.
Apresentado
sob o Nº de ordem 464 do protocolo Nº 1 fol. 20 v.
Averberado integralmente
sob o Nº da ordem 12 do Liv de averberação Nº 1, fls. 44v. 454.
Mocajuba, 20
de março de 1920
Oficial de
Registro Civil
Arthur Pedro
da Igreja”.
Atestado de naturalização brasileira de Sérgio Rascón Martínez, de 1920
O atestado também confirma a primeira Imigração da Família Rascón Martínez, da Espanha para o Brasil, em 1889.
“Atestado
Eu abaixo residente nesta Capital, atesto que o Senhor Sérgio Rascon Martinez, filho de José Rascón e Tomasa Martinez, residia nesta capital em mil oitocentos e oitenta e nove (1889), junto com seus pais, os quais não fizeram declaração nenhuma, a 15 de novembro do mesmo ano da Proclamação da República, aceitando portanto a grande naturalização, passo o presente atestado, por que nessa época eu já era residente nesta capital e, tenho verdadeiro conhecimento do acima referido, e por ser verdade, passo o presente atestado e assino.
Pará, 25 de outubro de 1920.
Pantaleão Vaqueiro Gonçalves”.
Título Eleitoral de Sérgio Rascón Martínez
Título Eleitoral de Sérgio Rascón Martínez |
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Nascimento
de Tereza.
Tereza Rascón de Freitas, segunda filha legítima de
Sérgio e Custódia. Nascimento: ?/?/1920, em Mocajuba. Casada. Falecida ainda
jovem sem gerar filhos, em Oeiras do Pará.
Os indígenas
Anambés em Mocajuba.
Este fato ocorreu quando Sérgio e Custódia ainda
viviam como marido e mulher em Mocajuba, mas não podemos confirmar o ano exato
do acontecimento.
Quando uma tribo dos indígenas Anambés, invadiram
Mocajuba, fortemente armados, vindos do rumo do limite entre os municípios de Mojú
e Mocajuba, todos da cidade correram, fecharam as casas e os comércios, mas um
só homem ficou de pé para enfrentar os indígenas. Este homem é Sérgio Rascón
Martínez. Naquele tempo os indígenas Anambés ainda se vestiam seminus com
penas, andavam descalços e ainda se pintavam seus corpos.
Naquela manhã ensolarada, aqueles que voltavam do
trabalho no campo, viram a tribo dos indígenas Anambés caminhando firme rumo à
cidade, correram de medo e foram gritando avisando que os indígenas estavam
vindos para a cidade, fortemente armados com suas armas artesanais. O medo
apavorou todo mundo. As mulheres gritavam: “Ai meu Deus, eles vão matar todos
nós”. Os maridos deram ordens às mulheres para entrarem nas casas, trancarem as
portas e janelas, e se trancarem dentro das casas fechadas. Os homens se
armaram com todo aquilo que podia ser usado como arma. Quem não tinha
espingardas se armaram com machados, facas e facões (terçados). Portas e janelas
das casas eram fechadas as pressas. Crianças e adolescentes se desesperaram em
choro. Os comerciantes fecharam imediatamente os comércios. Os comerciantes se
armaram com espingardas e, deram ordem para funcionários e alguns fregueses,
que ficaram presos dentro dos comércios fechados, tomaram as espingardas
penduradas como mercadorias para vender nas prateleiras. Cartuxos, chumbos e
pólvoras que estavam à venda como mercadorias foram retiradas das prateleiras.
Tudo parecia como um filme de terror. O pavor tomou conta de todo mundo.
Centenas de cidadãos entraram em oração diante das
imagens, quadros e oratórios de santos pedindo proteção para não morrerem sob
os ataques dos indígenas. As crianças e adolescentes receberam ordem para parar
de chorar senão os indígenas podiam ouvir a voz deles, entrarem nas casas e
matarem todo mundo.
No lugar onde hoje existe a Casa São Geraldo e a casa
ao lado da falecida Terezinha Furtado, no mesmo terreno, estava uma casa, no
estilo colonial, onde era a residência oficial e comércio de Sérgio Rascón
Martínez. No primeiro andar funciona a empresa “Seguin & Rascón” uma
sociedade comercial de Francisco Seguin Dias e Sérgio Rascón Martínez. Sérgio
era o sócio presidente da firma. Ali era um armazém. Atrás da casa, estava
parte do armazém onde estava os combustíveis e depósitos de mercadoria, a porte
que fica na frente do antigo mercado municipal. No segundo andar da casa,
funcionava a residência de Sérgio, ou seja, ele morava encima do comércio.
Quando Sérgio Rascón Martínez foi avisado da aproximação dos indígenas, deu
ordem para sua s esposa Custódia de Freitas Nogueira subir com as crianças e se
trancarem na parte de cima da casa. Custódia subiu com as crianças, e trancada,
olhava pelo buraco de cima da casa a chegada dos índios.
Sérgio não fechou o comércio, não se armou e não se
refugiou. Foi o único na cidade que não fechou o comércio, mas esperou pelos
indígenas.
Enfim, os indígenas marcharam sobre a cidade, não
encontrando ninguém. Marcharam na rua da orla da cidade, onde estava
concentrado o comércio primitivo da cidade, na parte compreendida entre o atual
Branco do Brasil e a casa do casal Ana e Pedro Kleber. Tudo estava fechado,
ninguém na rua. O único barulho era do andar e movimento dos indígenas. Os
cidadãos olhavam pelos buracos e brechas das casas, portas e janelas os
indígenas passarem nas ruas. Era um alivio quando a tribo passava, pois não
entraram sem suas casas.
Os indígenas
atravessaram a frente da Praça 13 de Maio, que depois mudou de nome para Praça
Nossa Senhora da Conceição. E viram um homem de pé na porta de seu comércio
esperando por eles. Os indígenas viram que aquilo era um comércio aberto, e
marcharam rumo ao homem que estava de pé esperando por eles na porta do
comércio. Este homem era Sérgio Rascón Martínez.
Os indígenas pararam na frente do homem de pé na
porta. Sérgio saudou os indígenas com boas vindas ao seu comércio, perguntou o
que eles queriam e como podia ajudá-lo. Custódia, esposa de Sérgio via tudo
pelo buraco de cima da casa, espionando e ouvindo tudo. Diante de Sérgio, os
indígenas baixaram uma grande quantidade de caças silvestres, onde havia grande
quantidade de jacaré e jabuti, muitas outras caças, raízes, milho, arroz e
verduras.
Embora falando um português difícil, enrolado e
errado, ele entendeu quando o cacique que liderava a tribo disse ao seu esposo
Sérgio: “Viemos fazer compra, queremos comprar mercadoria, mas não temos
dinheiro para comprar. Queremos trocar essas caças e os frutos da terra com as
mercadorias do seu comercio. O senhor pode trocar suas mercadorias com nossas
caças?”
Sérgio então deu ordem aos indígenas para entrarem no
comércio, deixaram e abaixarem suas caças dentro do comércio, e “pegarem” tudo
o que eles quisessem de mercadoria dentro do comércio. Assim fizeram os indígenas.
Sérgio foi surpreendido pela atitude dos indígenas,
pois pensava que os indígenas levariam como mercadoria, as armas para caçar,
enxadas, machados, faças facões, remédios e alimentos diversos. Os indígenas
levaram as garrafas de cachaça, vinho e outras bebidas, levaram muitas bebidas.
O foco deles estava na cachaça. Eles não tinham noção de quanto valia suas
caças e de quantos valia as bebidas levadas por eles. Pegaram a mercadoria,
deixaram as caças no comércio e foram embora.
Pelos buracos e brechas das casas, portas e janelas os
cidadãos viam os indígenas voltando e se retirando da cidade.
Depois disso, os cidadãos foram saindo aos poucos de
suas casas e comércios, a fim de buscar notícias do que aconteceu de fato na
cidade, para onde foram os indígenas, o que fizeram, quem mataram e quem
morreu. Quando souberam de toda a verdade, viram que os indígenas penas queriam
fazer compra na cidade.
Sérgio era vegetariano. Não comia caça e vários tipos
de comida. Sua esposa Custódia fazia diariamente dois tipos de comida, uma para
o marido e outra para elas e as crianças. A comida para o marido era
vegetariana, e ele gostava de abóbora. Ela achava que as crianças adoeceriam se
comessem só comida vegetariana.
Tudo o que os indígenas levaram para trocar com
mercadoria foi colocado à venda no comércio. Sérgio vendeu tudo o que os
indígenas levaram e ainda saiu no lucro.
Os indígenas Anambés voltaram mais três vezes em
Mocajuba, indo diretos ao comércio de Sérgio, já como fregueses, levar suas
caças e produtos da terra, a fim de trocar com mercadorias.
Nas outras vezes que foram a Mocajuba, os outros
comerciantes convidavam os indígenas para entrarem em seus comércios, porque
seus produtos eram lucrativos, pois os indígenas não levavam coisas caras. Mas,
os indígenas ficaram magoados e ressentidos com os comerciantes de Mocajuba,
dobrando o rosto para frente, passando direto, indo embora para o comércio de
Sérgio.
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